Muitos dos velhos tecidos encontrados em múmias egipcias eram coloridos: o uso de corantes pelo homem tem mais de 4.000 anos! Mesmo nas cavernas, utilizávamos pigmentos para fazer inscrições rupestres. Eram, inicialmente, obtidos de fontes naturais: o uso de corantes artificiais só iniciou em 1856. Entretanto, muitos corantes naturais utilizados na antiguidade ainda são empregados, e em larga escala. Exemplos são o índigo, um pigmento azul, estraído de planta homônima (indigofera tinctoria), a alizarina, um corante extraído da raiz de uma planta européia (madder) e a henna,utilizada até mesmo na indústria de cosméticos. Nosso país deve o nome a um corante: era do pau brasil que se extraía um pigmento capaz de tingir tecidos com cores fortes, como vermelho, rosa ou marrom.
A maior parte dos corantes fabricados vai para a indústria têxtil; mas as indústrias de artefatos de couro ou de papel, indústrias alimentícias, de cosméticos, tintas e plásticos também são usuários importantes. Como a demanda é muito grande e diversa, os químicos são desafiados a produzir corantes e pigmentos com propriedades particulares; este é um grande campo de pesquisa da química, sendo que vários pesquisadores brasileiros trabalham nesta área.
Nem todas as substâncias orgânicas são coloridas; para tanto, são necessárias algumas particularidades estruturais da molécula. As cores dos corantes e pigmentos são devidos aabsorção de radiação eletromagnética* na faixa da luz visível pelos compostos.
*(A radiação eletromagnética é causada por fótons, e o espectro eletromagnético se expande numa longa faixa de comprimentos de onda possíveis, de cerca de 1012m.
Isto corresponde a uma faixa que vai desde as ondas longas de rádio (~10 kilômetros) aos raio-X (~10 micrômetros) e raios gama. Nós somos aptos a detectar, com nosso corpo, uma estreita faixa desta radiação: com nossos olhos,detectamos a faixa de 400 a 700 nanômetros; com o tato, somos capazes de sentir a radiação na faixa do infravermelho e do micro-ondas, que provocam aquecimento da pele; nosso organismo utiliza a radiação ultravioleta para promover a formação da vitamina D, a partir de sua pró-vitamina. )
As cores estão relacionadas com comprimentos de onda particulares. O vermelho, por exemplo, corresponde à faixa entre 480 a 530 nm, e o azul, de 600-700 nm. Os compostos orgânicos podem absorver radiação eletromagnética. É disso que se valem as técnicas de análise de infravermelho ou espectroscopia de ultravioleta. Entrentanto, somente compostos com várias ligações duplas conjugadas na sua estrutura química é que são capazes de absorver radiação na faixa da luz visível. É a maneira e frequuência onde ocorre a absorção que define a cor do composto: a cor observada é a complementar à cor absorvida; os corantes pretos, absorvem radiação na em toda a faixa visível, enquanto que os brancos refletem toda a luz visível, e quanto mais estreita for a faixa de absorção, mais intensa e brilhante será a cor apresentada. Isto, sem dúvida, contribuiu para a popularidade dos corantes sintéticos, que absorvem em comprimentos de onda bem definidos. Os corantes naturais, em geral, resultavam em produtos com uma cor difusa e opaca.
Estruturalmente, um dos únicos aspectos comuns a praticamente todos os corantes é a presença de um ou mais anéis benzênicos; por isso, estes compostos são também chamados de benzenóides. Os primeiros corantes sintéticos eram derivados dotrifenilmetano, que em geral era obtido a partir da anilina ou da toluidina. Logo após, vários químicos começaram a trabalhar com derivados da antraquinona para a preparação de corantes. Hoje, este é o segundo maior grupo de corantesutilizados. Em 1901, Bohn produziu um substituto para o índigo, a partir da 2-aminoantraquinona. A BASF, empresa onde Bohn trabalhava, logo começou uma longa série de corantes análogos, e muitos são vendidos até hoje. Em torno da mesma época, o químico alemão Adolph von Baeyer descobriu que o aquecimento do anidrido ftálico com resorcinol (1,3-di-hidroxibenzeno) em solução aquosa produzia um novo composto, capaz de tornar a solução muito fluorescente; por isso foi chamadofluoresceína. Até hoje este composto é empregado nas placas de sinalização em rodovias brasileiras. Vários derivados da fluoresceína são hoje utilizados como corantes, tal como a eosina(tetrabromofluoresceína), que é largamente empregado como corante vermelho em cosméticos, tintas e papéis. Seu análogo eritrosina (tetraiodofluoresceína) é usado comocorante vermelho em alimentos. A fluoresceína é um xanteno, uma classe de compostos largamente empregados como corantes.
Os corantes azóico são outro grupo bastantes utilizados. Em comum, eles contém o grupo -N=N-, chamado "azo". A reação do ácido nitroso (HONO) com uma anilina Ar-NH2 dá o íon diazônio Ar-N=N+, que rapidamente reage com outras anilinas ou fenóis para formar compostos azóico.
Os corantes azóicos podem ser gerados no próprio tecido: o primeiro corante direto foi o Congo Red. Neste processo, o sal de diazônio do corante precisa reagir com uma outra molécula para formar o corante azóico. O tecido é previamente tratado com uma solução desta molécula de acoplamento, e, então, imerso em uma solução do sal de diazônio, e formar o corante diretamente no tecido. Este método foi patenteado em 1880; um outro processo similar, onde o tecido é inicialmente mergulhado em uma solução do sal de diazônio e, só depois, imerso em uma solução da molécula de acoplagem, foi patenteado sete anos mais tarde. A maior parte dos corantes empregados neste método eram derivados da anilina.
congo red
Em 1912, descobriu-se que o composto 2-hidróxi-3-naftanilida(Naftol AS) pode formar um íon soluvél em água, com bastante afinidade pelo algodão. Ele poderia reagir com um componente diazóico, e formar vários corantes largamente empregados. Um deles é o Fast Scarlet, como visto na figura ao lado. Durante o tingimento do tecido, as indústrias têm à mão mais de 100 tipos de Naftol AS e mais de 100 tipos do componente diazóico; o número de combinações possíveis é muito grande, entretanto somente algumas combinações é que são, de fato, utilizadas.
Os grupos -OH e -NH2, em um anel benzênico, direcionam a acoplagem com sal de diazônio para as posições ortho e para; estes efeitos dependem do pH, pois ambos grupos são ionizáveis. O ácido-H (ácido 8-amino-1-naftol-3,6-dissulfônico) tem estes grupos e pode ser acoplado seletivamente a dois componentes azóicos diferentes. O coranteAcid Black 1 é obtido pela acoplagem com o íon diazônio da p-nitroanilina, em um solução ligeiramente ácida. Só então é adicionada a outra solução, alcalina, com o íon diazônio da anilina.
Os mais importantes cromógenos do século XX foram, sem dúvida, os derivados dasftalocianinas, introduzidos em 1934. Estes compostos são análogos duas porfirinas naturais: a clorofila e a hemoglobina. As ftalocianinas, tal como as porfirinas, formam complexos com metais, e os complexos com cobre são os mais importantes. Estes pigmentos exibem cores fortes, brilhantes e resistentes. A clorofila também poderia ser utilizada como pigmento, mas sofre a decomposição pela ação da luz solar ou calor. Outro grupo de corantes que também apareceu no século passado foram os derivados da quinacridona. Este composto é utilizado como um corante violeta; o análogo dicloro é rosa e o análogo dimetil é vermelho.
Em 1956, um novo método para a introdução de corantes no tecido foi patenteado: os corantes reativos. Neste processo, um grupo reativo é introduzido no corante; este, então, liga-se covalentemente às moléculas das fibras do tecido, principalmente o algodão. Os primeiros corantes reativos tinham um grupo diclorotriazina (triazina é um heterociclo com 3 átomos de carbono e 3 de nitrogênio). Os átomos de cloro deste composto podem ser substituídos por grupos -OH ou -NH2; é isto o que acontece, quando o corante reage com a fibra: os cloros são substituídos pels grupos hidroxilas da celulose (algodão) ou aminos das proteínas (lã).
corante reativo
A Hoechst desenvolveu outro tipo de corantes reativos, onde as moléculas dos corantes são conectadas a um grupo reativo devinilsulfona (VS). Hoje, muitos corantes existem na forma reativa. Foi só com a introdução desta técnica que o algodão pôde ser tingido com cores fortes e vivas.
Os plásticos, as fibras naturais e o papel tendem a escurecer ou amarelar com o tempo, devido a fraca absorção de luz na faixa dos 400 nm por certos grupos: peptídeos na lã ou na seda, flavonóides na celulose, e produtos de decomposição em polímeros. Os químicos encontraram uma solução para este problema: a adição de um composto fluorescente que absorve radiação UV e emite luz visível - também na faixa de 400 nm. Assim, o efeito do envelhecimento é mascarado. Estes compostos são conhecidos como branqueadores ópticos, e são utilizados em papéis, tecidos, detergentes, sabões e polímeros. A maioria destes branqueadores contém grupos stilbeno ligados a unidades de triazina, como oBlackophorB, um dos mais utilizados.
Os corantes são aplicados, geralmente, com um banho, do tecido, em uma solução aquosa do corante. Este deve migrar para a fase sólida (tecido) e não sair com adição de água (senão a roupa desbotaria a cada lavada!). Aretenção das partículas do corante pelas fibras do tecidoenvolve várias forças atrativas, incluindo interação iônica, forças de Van der Waals e ligação hidrogênio.
As interações iônicas ocorrem no caso de corantes aniônicos (ácidos) ou catiônicos (básicos); estes grupos interagem com os grupos de polaridade oposta presente nas fibras. Algumas vezes é necessário a adição de sais metálicos (mordante) ao tecido; os metais complexam com os grupos polares das fibras, resultando em sítios mais polarizados, e então aptos a uma interação mais forte com as moléculas do corante.
Interações intermoleculares também estão presentes nas ligações fibra-corante. Tanto as fibras como os corantes possuem grupos, com átomos O, N ou S, altamente polares. Grupos -OH são capazes de fazer ligações hidrogênio, a mais forte interação intermolecular. Os grupos fenólicos, nos corantes, tem dupla função: atuam como auxocromos e fornecem sítios para ligações hidrogênio.
A ligação entre a fibra e o corante pode ser, ainda, do tipo covalente: é o caso da interação nos corantes reativos, que são ligados a um grupo eletrofílico, capaz de reagir quimicamente com a fibra.
Uma nova moda entra a cada estação: novos tecidos, novos cortes e novas cores. É por isso que o trabalho do Químico Têxtil não pára, e esta é uma área de pesquisa crescente na química moderna. Como importamos, ainda, quase que todos os corantes utilizados em nossas indústrias, é natural se esperar que ocorram mais incentivos financeiros para trabalhos neste campo.
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sábado, 29 de outubro de 2011
QUIMICA DAS CORES
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